Não se sabe como ele veio parar ali.
Eram os primeiros dias do nascimento da PMRO, quando assumia o seu primeiro comandante geral, o Cel PM IVO CÉLIO DA SILVA, de imorredoura lembrança. Não lembro também se já tinha a graduação de cabo. Lembro só que foi designado na função de “motorista do comandante”. Uma honra a ser cantada perante os pares. Parecia envelhecido para a idade, que aparentava bem maior do que registravam seus documentos.
Disse-me, tempos depois, que começara a trabalhar desde os 15 anos, sendo o primeiro emprego como auxiliar de foguista da companhia que operava a lendária Estrada de Ferro Madeira-Mamoré, onde permaneceu até a sua maioridade. A missão era penosa: no longo trecho de cerca de 300 quilômetros entre Guajará Mirim e Porto Velho, enfrentava o frio das madrugadas e as chuvas torrenciais na boca da fornalha, numa alternância de temperaturas insalubre. Talvez tenha sido isso que deixara marcas profundas na sua face, imaginava ele.
Essas marcas trilharam em seu coração, tantos foram os romances e amores não correspondidos. Sá na maturidade, finalmente, encontrou a companheira de sua vida, que lhe deu uma filha, da qual se orgulhava, por vê-la fazendo o curso de medicina. Isso ele me falou há cerca de 5 anos, quando nos encontramos em Porto Velho. Foi a última vez que nos vimos. Recordamos o tempo em que tive a honra de tê-lo como motorista durante o meu comando na PM. Foram quase 3 anos, que deixaram também marcas recíprocas de camaradagem e lealdade.
Verdadeiramente descortinava nele a imagem do pioneiro: aquele nascido na fronteira, forjado no seio de uma família nordestina da longínqua era dos soldados da borracha. Educação dura e forjada nos valores cristãos, da dignidade do trabalho, da honra e da honestidade. Tanto que aquele primeiro emprego, o fizera como auxiliar do seu pai nas cabines de força das máquinas a vapor. Época das Marias-Fumaça. Na PM era exemplo de policial militar disciplinado e cumpridor dos seus deveres.
Sempre queria fazer mais e melhor. As viaturas sob a sua responsabilidade, inegavelmente se encontravam sempre limpas e em perfeitas condições de uso, dado o seu interesse em acompanhar todas as manutenções. Não admitia que fossem lavadas em postos, senão se ele mesmo estivesse à frente dos serviços. Certamente por isso foi longeva a sua continuidade na mesma função durante quase toda a sua permanência na ativa, mesmo quando promovido à graduação de sargento. Nesta data, com a notícia da sua partida, senti-me pequenino diante da figura que, em vida, foi o GRANDE ARTUR.
Deixa o exemplo de verdadeiro pioneiro. Segue agora em meio às brumas das madrugadas que permearam os tempos de outrora, desta feita em direção ao poente eterno, que a letra do hino de Rondônia homenageia: “Comosentinelas avançadas, Somos destemidos pioneiros, Que destas paragens do poente, Gritam com força: “Somos Brasileiros!”
Meus sentimentos aos pioneiros que perdem um dos seus e à estimada família enlutada, com a certeza de que a benção de Deus os confortará.
Autor: João Maria Sobral de Carvalho, Cel PM RR, Ex Cmt Geral da PMRO
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Jornalista Lenilson Guedes