Polícia Militar de Rondônia

Ex-comandante da PMRO, coronel RR Carvalho, enaltece registro histórico do Colégio Tiradentes

tiradentes

Em algumas visitas que fiz ao Estado e a alguns órgãos da Polícia Militar deparei-me com a ausência de referenciais históricos, que, a meu ver, revelam lacunas que devem ser preenchidas para que não se percam para sempre nas brumas do tempo.

Por outro lado, trouxe-me grande alegria a iniciativa dos filhos do nosso saudoso Cel PM VIEIRA, ao levarem ao Comandante Geral da Corporação, o Cel PM RONALDO, uma cópia da monografia produzida por seu pai no Curso de Aperfeiçoamento de Oficiais na PM/PE, no ano de 1987, versando sobre proposta para a criação do Colégio da Polícia Militar.

Esse episódio foi reproduzido nas mídias sociais internas, revelando o interesse daquela autoridade em promover os devidos registros históricos. Isso me incentivou a apresentar esta singela contribuição, posto envolver fatos que vivi durante o meu Comando, que se somam àquela iniciativa e pretendem jogar um pouco de luz aos acontecimentos de então, de sorte a possibilitar a formação de retrato que mais se aproxime da realidade histórica da criação do Colégio da Polícia Militar, como expendido adiante.

tiradentes

I – INTERCESSÃO CONJUNTURAL HISTÓRICA

No triênio 1987/1990, tive a gratificante missão de exercer o cargo de Comandante Geral da Polícia Militar do Estado de Rondônia. O Estado de Rondônia ainda não alcançara sequer uma década de sua criação, encontrando-se ainda na fase inicial da consolidação de sua estruturação, ao largo de conviver com o maior fluxo migratório nacional do século XX, em atendimento ao chamado Plano de Integração da Amazônia, retratado pelos grandes programas de polos agropecuários e minerais dos governos militares, incidentes principalmente em Rondônia. Era a expansão da nova fronteira agrícola, sob o lema “Integrar para não Entregar”.

A Polícia Militar mal completara o primeiro decênio de sua implantação, ainda carente de inúmeros equipamentos e instrumentos para o fortalecimento de sua estruturação, vista na sua mais ampla integração com a sociedade assistida.

De fato, os primeiros anos de sua existência haviam se voltado essencialmente para a implantação de sua estrutura operacional, ao lado de um razoável sistema de apoio logístico e incipiente atuação de órgãos voltados para a assistência de saúde.

II – A MUDANÇA DE PARADIGMA PARA O C.A.O.

Naquele ano de 1987, em que oficiais e praças alcançavam os interstícios para a participação em cursos de aperfeiçoamento, a PMRO, contando com a disponibilização de vagas nas Polícias Militares mais antigas e consolidadas, designava os habilitados para frequentá-los.

Como se sabe, dado o grau e a natureza dos cursos de aperfeiçoamento para oficiais, as escolas militares passaram a exigir a produção de trabalho científico, destinado a obter conhecimento destinado à melhoria da prestação dos serviços da polícia ostensiva.

Nesse sentido, é que a orientação do Comando a partir daí foi para que os trabalhos de conclusão de curso (TCC ou monografia) abordassem temas que pudessem ter aplicação prática na PMRO, quando não, que servisse como matéria prima para o aprimoramento e aperfeiçoamento das atividades da Corporação.

No âmbito desse novo paradigma, destacam-se como trabalhos que tiveram acolhida e aplicação na Corporação, os seguintes:

– Proposta para criação do Colégio da Polícia Militar, objeto de monografia apresentada pelo então CAP PM Carlos Roberto Vieira de Vasconcelos;

– Proposta para implantação do Policiamento Padrão na PMRO, objeto de monografia apresentada pelo então CAP PM Edson Xavier de Lucena;

– Uma nova visão psicológica do policial militar voltada para a sua melhor integração com a atividade policial militar, objeto de monografia apresentada pelo então CAP PM Abimael Araújo dos Santos.

Paralelamente ao aperfeiçoamento dos oficiais no âmbito do Quadro de Oficiais Combatentes, o comando também adotou idêntica política para o Quadro de Oficiais de Saúde, tendo designado Capitães para frequentar os cursos de especialização em bucomaxilofacial, administração hospitalar e em indústria farmacêutica, todos com aplicação imediata nos serviços de assistência à saúde da Corporação.

III – A PRIMEIRA INICIATIVA PARA A CRIAÇÃO DO COLÉGIO TIRADENTES DA PMRO

No contexto acima narrado, o então Capitão PM Carlos Roberto VIEIRA de Vasconcelos, que frequentava no ano de 1987 o Curso de Aperfeiçoamento de Oficiais na Polícia Militar do Estado de Pernambuco apresentou trabalho monográfico intitulado “PROPOSTA PARA CRIAÇÃO DO COLÉGIO DA POLÍCIA MILITAR DO ESTADO DE RONDÔNIA”, do qual tive a deferência de ser escolhido seu orientador.

Submetido o trabalho monográfico ao Corpo Técnico dos órgãos de estudos superiores da Academia de Policia Militar do Estado de Pernambuco, foi ele aprovado, notadamente por sua objetividade e possibilidade de aplicação prática na PMRO.

Resulta daí que foi esta a primeira e principal iniciativa para a instituição do Colégio da Polícia Militar do Estado de Rondônia, cabendo o necessário registro na história da Corporação e do próprio colégio.

IV – PASSOS DECISIVOS PARA TRANSFORMAR EM REALIDADE O COLÉGIO TIRADENTES DA PMRO

No ano de 1988 apresentei ao Governador Jerônimo Santana projeto para a criação de unidade do Colégio Tiradentes, desta feita decorrente de estudos do Estado-Maior com a colaboração da Associação Tiradentes da Polícia Militar. Visava com a exposição do projeto demonstrar a sua importância e pertinência.

O Governador manifestou interesse na sua implantação, porque via na iniciativa a possibilidade de criar um contraponto com as escolas públicas estaduais, lembrando na oportunidade o quanto conhecia acerca de idêntica escola que conhecera em Minas Gerais. Assumiu o compromisso com a instituição do Colégio Tiradentes, marcando data para a apresentação da proposta para os secretários de Planejamento, Fazenda, Obras e Educação, na qual ficaram definidas ações a serem desenvolvidas por cada área.

Na semana seguinte, acompanhei-o a Brasília junto com o Secretário de Educação, Dr. José Albuquerque, para audiência no Ministério da Educação, onde se conseguiu recursos a fundo perdido para a construção da sede do colégio, aproveitando estrutura em utilização no Ministério, denominada “Projeto Monhangara”.

A partir daí, iniciou-se a busca de uma área na capital que pudesse atender à construção da unidade escolar, de preferência que pertencesse ao Estado. Não encontramos áreas que se adequassem às particularidades do colégio. Entretanto, eis que surge a oportunidade, quando a ASTIR se encontrava em negociação com uma área perto do complexo do Comando Geral e do 1º BPM, destinada à sua futura sede administrativa.

A área comportava com folga a sede da ASTIR e do Colégio, havendo sido acordado, observada a destinação esportiva e sócio educacional dela (ASTIR), de sorte que foi feita a doação de parte daquela área para a construção da unidade do colégio militar, conquanto àquela altura já fora assinado o convênio com o MEC, com a correspondente liberação dos recursos.

Destaco a atuação do Cel PM João Ricardo CARDOSO e do Cel PM Carlos Roberto BORRÉ, assim como outros integrantes do Conselho de Administração da ASTIR que atuaram com extrema dedicação e entusiasmo para se conseguir alcançar o objetivo pretendido.

Assim disciplinado, a construção ficou sob a responsabilidade da Secretaria de Obras, que entregou as instalações prontas no final de 1989. A sua inauguração ocorreu no mês de fevereiro de 1990, pouco menos de um mês após deixar o comando e entrega-lo ao Cel PM ZIMMERMANN.

A partir daí é que se tem algum registro sobre a história do Colégio Tiradentes da Polícia Militar.

V – DISPOSITIVO DO ADCT DA CONSTITUIÇÃO ESTADO DE RONDÔNIA SOBRE O COLÉGIO TIRADENTES.

Na Constituição do Estado de Rondônia, outorgada no ano de 1989, no artigo 22 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias consta a criação do Colégio da Polícia Militar de Rondônia, com o seguinte texto:

“Art. 22. Fica criado o Colégio da Polícia Militar, com sede na Capital do Estado.”

Esse dispositivo foi, no devido tempo, regulamentado por meio de lei ordinária, matéria que é do amplo conhecimento dos integrantes da Polícia Militar.

Nada obstante, entendo necessário que se levante o véu que encobre as articulações no seio do processo constituinte, que permitiu fazer constar no texto da Carta Política de Rondônia essa disposição.

Refiro-me às pessoas que levaram adiante a matéria, a começar pelo Cel PM Eudes Rosa CABRAL, à época designado assessor da Polícia Militar junto à Assembleia Estadual Constituinte. Nesse sentido é que, havendo discutido o tema com outro assessor constituinte (José Carlos Cavalcante), trouxe-o ao comando da Corporação, já que encerrava matéria de interesse direto nosso.

De fato, a construção do prédio do Colégio Tiradentes, àquela altura, já caminhava para a sua conclusão, parecendo de boa medida a materialização normativa constitucional, de sorte que o Cel PM CABRAL obteve o patrocínio da emenda pelo Deputado Constituinte Heitor Luiz da Costa Jr, que a apresentou e obteve a aprovação do corpo constituinte.

VI – CONSIDERAÇÕES FINAIS

A passagem do policial militar pela Corporação tem começo, meio e fim. Entretanto todo aquele que, de alguma forma, contribuiu na sua edificação e no seu aprimoramento além do dever normal exigido, deve merecer o reconhecimento da instituição para que as gerações que o sucedem possam se espelhar no exemplo, quando não, possam conhecer a história de cada um desses conhecidos ou anônimos heróis.

Verdadeiro é o aforisma alertando que “QUEM NÃO TEM PASSADO, NÃO TEM FUTURO”, a nos lembrar que cada um faz a sua história e deve, por isso, ser lembrado.

Bem sei que os afazeres e responsabilidades do dia-a-dia nos afastam dos acontecimentos do passado, conquanto nos pareça natural e imperceptível às vezes, que só existimos hoje porque outros lutaram para que existíssemos.

Essa preocupação sempre foi uma constante naqueles anos distantes em que inúmeros e incontáveis pioneiros construíam a Corporação, embora isso não os afastasse da lembrança daqueles que os antecederam em anos de inimagináveis dificuldades. Mas eles deixaram o seu legado, o qual, em oportuna ocasião de comemoração ao Dia de Tiradentes do ano de 1989, tive oportunidade de assinalar na ordem do dia.

Peço vênia para transcrever trechos pertinentes e indissociáveis do apelo à memória dos milicianos que já se foram:

“Volto-me, nesta data, aos integrantes da extinta Guarda Territorial, velhos companheiros que nos antecederam nas missões de polícia preventiva, razão pela qual ficaram definitivamente ligados às tradições da milícia rondoniana.

Aqui chegados nos idos de 1943, na maioria jovens cheios de esperança vindos do Nordeste, fundaram a Guarda Territorial, órgão responsável pelos serviços públicos de saneamento, energia elétrica, construção de edificações públicas, atividades portuárias, carceragem e policiamento. Deixaram sua marca nesta terra de Rondon, assim como o tempo e os rigores das missões marcaram-lhes as faces, enrugadas, é verdade, mas revelando a serenidade e altivez, próprias do velho soldado, que encosta o seu fuzil, com a suprema felicidade do dever cumprido.

Recebam com esta homenagem, a continência da Polícia Militar de Rondônia, que busca trilhar o caminho de tenacidade, amor ao trabalho e dedicação, atributos que os identifica com a gloriosa Guarda Territorial.”

 

Os primeiros oficiais e praças concursados com a finalidade de integrar a Polícia Militar de Rondônia chegaram no ano de 1974, trinta e um anos após a criação da Guarda Territorial.

Digo que tiveram a sorte de suas vidas de poderem levar adiante a construção da Polícia Militar de Rondônia. Todos, de alguma forma, contribuíram nessa verdadeira epopeia.

Por essas razões todas, agora voltando ao ponto destas reminiscências, tenho a singela e justa pretensão de contribuir para descortinar os fatos que deram origem à criação do Colégio da Polícia Militar, com a anotação do trabalho do então Cap PM Carlos Roberto VIEIRA de Vasconcelos, que surgiu com a força matriz, revelada na sua monografia.

O Cap VIEIRA, já na reserva no posto de Coronel PM, não teve o seu trabalho reconhecido em vida, conquanto o curso do tempo com os seus atropelos deixou cair no esquecimento a verdadeira origem histórica do Colégio da Polícia Militar, ao ponto de se imaginar que pudesse ter surgido por uma força sobrenatural espontânea, em algum momento do século XX, no seio da Polícia Militar de Rondônia.

Em boa hora, tomo a liberdade de contribuir para desvelar a história dessa importante instituição de ensino da nossa Corporação e das pessoas que merecem ser reconhecidas.

Por derradeiro: É tempo de lembrar que não é a história que faz os homens; são estes que deixam as pegadas para a construção da história.

Em Goiânia, GO, 25 de fevereiro de 2019.

João Maria Sobral de Carvalho

Cel PM R/R – Ex-Cmt Geral da PMRO

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *